Por trás do preço do pão francês, que pode chegar a R$ 18,90 nas padarias de Belo Horizonte, está o trigo, que acumula, em 2020, o maior valor médio dos últimos anos. Com a desvalorização do real frente ao dólar e a dependência brasileira de trigo importado, a tendência é que produto continue em patamares altos nos próximos meses. Segundo especialistas, o aumento da produção interna é o que pode contribuir para a redução do custo da commodity, tão presente na mesa dos brasileiros.
“Há desvalorização do real de mais de 40% desde o início do ano, o preço do trigo importado da Argentina e de outros países está subindo, e a safra brasileira, cuja colheita está começando agora, também está com preço alto, porque o produtor brasileiro está exportando um pouco. A expectativa é que o preço do trigo se mantenha nos níveis atuais, talvez um pouco mais altos”, afirma o presidente da Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), Rubens Barbosa.
Segundo Barbosa, o Brasil importa entre 55% e 60% das cerca de 12 milhões de toneladas de trigo que consome anualmente. Somente neste ano, até julho, o país comprou em torno de 3,9 milhões de toneladas de fora, a maior parte da Argentina, que passou a diversificar os consumidores e vender mais para outros mercados, o que também contribuiu para a alta do preço. Dados da Abitrigo mostram que a tonelada do trigo argentino custava, em média, R$ 903 no ano passado e, neste ano, passou a R$ 1.173.
O que pode ajudar a reduzir o preço do trigo é o crescimento da produção interna, que deve acontecer neste ano, de acordo com o analista sênior da T&F Consultoria Agroeconômica, Luiz Carlos Pacheco: o Paraná deve colher 3,4 milhões de toneladas, metade nas próximas duas semanas. “Vai ter bastante trigo aqui, o que vai pressionar os preços para baixo e diminuir a necessidade de importação. No ano passado, foi de 6,6 milhões de toneladas. Neste ano, serão 5,5, milhões. Quem tiver de importar vai pagar mais caro”. Conforme dados da Abitrigo, o trigo brasileiro está custando, em média, R$ 1.061 em 2020.
De acordo com o presidente do Sindicato e Associação Mineira da Indústria de Panificação (Amipão), Vinicius Dantas, o preço da farinha se estabilizou nos últimos três meses, mas em níveis altos. Em outubro do ano passado, o pacote de 25 kg custava em torno de R$ 56 a R$ 58 e, hoje, está na faixa de R$ 70 a R$ 77. “A padaria não teve outra opção a não ser fazer um sacrifício e manter os preços. A pandemia e a crise econômica trazem mais dificuldades para o consumo”, diz Dantas.
Segundo ele, a tendência é que o preço do pão permaneça estável, desde que o custo do trigo não cresça demais. Ontem, uma pesquisa do Mercado Mineiro mostrou que o produto custa, em média, R$ 14,07 em Belo Horizonte. Mas, entre os estabelecimentos, o quilo pode variar de R$ 9,50 a R$ 18,90. “A variação é uma questão de custeio”, afirma.
Proprietária de uma padaria no bairro Califórnia, na região Noroeste de Belo Horizonte, Luciana Balsamão diz que vem sentindo o aumento no preço da farinha de trigo, mas não repassou a alta para os consumidores. Há mais de um ano, o quilo do pão francês custa R$ 12,50 no estabelecimento. “Está todo mundo apertado, sem dinheiro, a muçarela e os derivados do leite já aumentaram, e a margem do pão é boa, é o que sustenta a padaria. Manter o preço é uma forma de fidelizar o cliente”.
Minas Gerais quer aumentar produção de trigo
A Associação Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo) defende a ampliação da produção nacional de trigo para a redução da dependência externa e da redução do preço.
“Precisamos reduzir a vulnerabilidade e a dependência externa de um produto tão estratégico quanto o trigo, que está na mesa de todos os brasileiros. Isso não ocorre da noite para o dia, mas, com o apoio do Ministério da Agricultura, vai haver uma tendência de ampliação das áreas plantadas nos próximos anos”, afirma o presidente da entidade, Rubens Barbosa.
Em Minas Gerais, o governo está incentivando o aumento do plantio de trigo. Atualmente, o Estado é responsável por 3% da produção nacional, atrás de Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo.
“O trigo tem algumas características do sul, e nós aqui, a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) junto com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), temos trabalhado muito na introdução do trigo no cerrado. Em 2005, produzimos 64 mil toneladas, hoje são 205 mil. É pouco ainda, mas já é um ganho de três vezes em relação a 15 anos atrás”, afirma o subsecretário de Política e Economia Agropecuária do Estado, João Ricardo Albanez.
Segundo ele, a região do Alto Paranaíba é a maior produtora de trigo em Minas Gerais.